Imagine por um segundo que carrega consigo uma mochila. Quero que ponha lá dentro tudo o que tem. Começando pelas coisas pequenas, cartões de crédito, papéis... Depois coloca coisas um pouco maiores, roupa, sapatos, a sua televisão... Por agora, a sua mochila já deve estar bastante pesada. Passamos então para coisas ainda maiores, o sofá, o carro, a casa... Quero que coloque tudo dentro da mochila. Agora, vai enchê-la com pessoas. Comece pelos conhecidos, amigos dos amigos, colegas de trabalho. Depois, as pessoas a quem confia os segredos mais íntimos, irmãos e irmãs, os seus filhos, os seus pais, e finalmente o seu marido ou mulher, namorado ou namorada... Todos dentro da mochila. Sinta o peso dessa sua mochila. Não se engane, as suas relações são o componente mais pesado da sua vida. Todas as negociações, argumentos, segredos, compromissos... Quanto mais devagar nos movemos mais depressa morremos. Não se engane: mover é viver.
Este é o lema de vida do protagonista do filme Up In The Air, interpretado por George Clooney. Este personagem vive completamente alienado dos outros, talvez até dele mesmo. O seu emprego é despedir trabalhadores de empresas alheias e para tal viaja pelo país durante praticamente o ano inteiro. Assim, adopta um estilo de vida que não lhe permite criar qualquer tipo de relação, nem com sítios nem com pessoas. Nada lhe é familiar a não ser a constante movimentação. E a verdade é que ele parece viver satisfeito com a sua “mochila vazia”, sem perceber que a frieza e distanciamento que essa mochila exige, acabaram por absorver também a sua própria identidade. Vive desprendido de tudo, sem qualquer compromisso emocional, longe da família e sem intenções de casar ou ter filhos, e o seu objectivo de vida acaba por ser juntar milhas até atingir um determinado número, algo tão vazio quanto a sua mochila.
Também nós, alienados da realidade ao ver o filme, somos inicialmente levados a acreditar pelo produtor que essa sensação de aparente liberdade é desejável. Mas à medida que nos deixamos envolver pela história, vamos sentindo o peso sobre os ombros a aumentar, tal como o protagonista começa a sentir quando pela primeira vez se envolve emocionalmente com algo exterior à rotina que o envolve a ele: uma mulher. Desenrolam-se então uma série de acontecimentos que vão fazendo com que o protagonista se comece a questionar sobre o seu modo de vida, ponderando como seria “assentar os pés na terra”, desalienar-se...
Considero assim este filme, um bom exemplo da aplicação do conceito de alienação tratado por Karl Marx. Apresenta-nos a alienação como resultado da sociedade de consumo actual, das exigências do mercado, e até do desenvolvimento das tecnologias e da mobilidade a que hoje temos acesso muito facilmente.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.