quinta-feira, 22 de novembro de 2012


Os Idiotas

Perante os temas apresentados e dissecados no correr das aulas de Cultura Visual, à luz dos seus autores, e perante a necessidade de os encadear, estruturar e compreender, recorrendo à imagética assimilada e disponível, é recordada, ainda que na diagonal, a película Canino, realizada, em 2009, pelo grego Yorgos Lanthimos. Concluindo que parte da matéria de estudo está latente nas situações mais desconcertantes deste filme recente, surgem imagens de outra obra que, pela crueza do Dogma 95 onde se entranha e pela maior distância temporal, parece mais propícia: Os Idiotas.

Os Idiotas, Lars von Trier, 1998
Explorando, em comunidade e a pretexto de estudo ambíguo, hipotéticas vivências em estado de deficiência mental, o grupo restrito promove, pela cumplicidade gerada, situações limite onde, testando as suas capacidades de abstração, tenta - refugiado na comodidade do anonimato, afastado das vivências individuais -, por em causa a ideologia onde se insere.
Em campo aberto, tendo como laboratório o quotidiano e as suas idiossincrasias, o dinamarquês Lars von Trier, em 1998, consegue dar ao  observador atento, para além do mais, a perceção da ideologia envolvente, a sua elasticidade e o embaraço incitado quando esta é posta em causa. Sendo também possível, no visionamento, pela diferenciação da atuação insólita dos personagens, aflorar, entre outros, o tema da identidade do sujeito.
Provocação, desestabilização, inconsequência, insolência são recursos convocados na improvisação, negando a superficialidade e evidenciando a deformação ideológica inerente. Em certo sentido, aos olhos do espetador, a subversão das regras imposta pelo jogo privado em decurso legitima e dá sentido à norma social, reforçando-a.
Quando tantas barreiras parecem ceder aos desígnios e a prevalência dos intentos inusitados tende a fazer parte da nova hegemonia diletante proposta ao espetador, o repto assoma no caminho da imprevisibilidade ilimitada: observar as capacidades de desempenho isolado de cada ‘idiota’ na intimidade familiar ou laboral. Talvez a última fronteira da significação de cada sujeito; aquela que lhe atribui, em primeira instancia, significado e através da qual ele se significa. Althusser estará, decerto, por perto.
Aqui chegados, os que sugerem maior fragilidade emocional na primeira abordagem - em grupo, no conforto e descomprometimento de quotidiano que não os identifica -, parecem ganhar trunfos surpreendentes por, de alguma forma, estarem, desde o início, na senda de nova significação de si próprios e, na deriva, procurarem, convictos, ideologia renovada e desigual. Os únicos, por estarem conscientes e discordantes da sua identidade, capazes de testar a própria significação intrínseca. Em boa verdade, a saída alegórica da sua própria caverna.
De narrativa mais intimista, ainda que não de menor complexidade e interesse, fica por abordar o argumento de Canino. Talvez, em próxima intervenção ou, quem sabe, em abordagem oportuna de outro parceiro das cumplicidades de Cultura Visual.

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