quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Não faz sentido!

Não querendo repetir o que já discutimos em aula apresento uma reflexão directamente relacionada com a ideia em geral de ideologia:


Como assim, o ser humano? Milhões de anos de coisas a acontecer no vazio, planetas para aqui e para ali, água, micróbios e de repente o quê? Dentro de todo um infinito de probabilidades surge um ser capaz de conceber ideias, comunicá-las, construir, experimentar sensações, capaz de tudo. E nós achamos que é normal. Não seríamos capazes sequer de conceber outra realidade. 

E como assim, trabalhar? É mesmo verdade, as pessoas desde que nascem entram neste esquema que é aprender para poder trabalhar até morrer, não é mentira. Trabalhar até morrer! Já vimos que os animais não trabalham e sobrevivem, mas nós não podemos escapar ao horário que molda as nossas vidas. Não podemos mesmo. E nós achamos isto normal, quer dizer, todos os dias da minha vida sair de manhã para fazer uma coisa qualquer que possivelmente até nem me diz nada, para voltar a casa à noite sistematicamente. É normal.

E como se não bastásse, estou eu a andar na rua muito bem e passa uma pessoa que não conheço. Ignoramo-nos mutuamente, no sentido da palavra, essa pessoa não podia ter menos importância para mim. Mas porquê? Essa pessoa tem tanto mais em comum comigo quanto eu poderia imaginar! É um ser humano tal como eu, tem nariz como eu, dois olhos como eu, orelhas, pernas, braços... E no entanto nem todas essas semelhanças justificam uma simples interacção.

Mais dentro deste ultimo raciocínio:
Toda a gente tem uma barreira ideológica. Vive dentro dessa barreira, trá-la para todo o lado. É a barreira que deixa as pessoas inquietas quando alguém as aborda, um aviso de que o que está a acontecer é uma irregularidade, para ter atenção. É protectora, e as pessoas criam-na exactamente pela necessidade de segurança. Mas apesar de protectoras, as barreiras destroem todas as possibilidades de experiência no quotidiano, no presente (tempo em que decorre a própria vida), para passar a dizer às pessoas que o que importa realmente é o futuro, como lá chegar e o que fazer a seguir. As pessoas vivem à espera. Entro no metro e o que vejo senão pessoas à espera, cada uma dentro da sua barreira, a fingir que não existe ninguém naquele metro para além de si próprio. Pessoas caladas, com olhar distante, à espera. A pessoa que está mesmo à sua frente podia ser a pessoa com quem teriam a conversa mais interessante do mundo, a pessoa ao lado podia ser o amor da sua vida. E quase de certeza que são mesmo, mas ninguém se atreve a interagir com ninguém! Eu próprio estou preso na minha barreira enquanto vejo o desenrolar deste desespectáculo, calado, quieto como todos os outros. Hora de ponta, toda a gente apertada lá para dentro. As pessoas literalmente tocam-se, encostam-se umas às outras, e mesmo assim, precisam de fingir que não têm nada a ver com ninguém! Cada um olha para o seu lado, não se passa nada, estou só aqui à espera... à espera do futuro, à espera de ficar à espera. Tudo isto por medo de acabar com o conforto da sua barreira. E se conseguissemos ser superiores à nossa barreira? Dominá-la em vez de ela nos dominar. Falar com alguém que não conheçamos só porque nos apetece, sem ter de fingir um contexto ou ficar à espera de um pretexto, que é exactamente o que se faz nessa situação, um teatro. É muito dificil, a barreira diz-nos que é melhor não, o conjunto de todas as barreiras (o consenso) torna a situação perigosa. Se tentásse o mais provável seria que a barreira da pessoa que abordo a impeça de manter essa proximidade que estou a tentar estabelecer. Mas por outro lado se eu conseguisse aceitar a pura realidade de que não teria mal nenhum em tentar, porque não tem mesmo (e mesmo se não funcionásse não perderia nada), seria capaz de dar esse grande passo para a liberdade.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.