terça-feira, 4 de dezembro de 2012

A vista de lá para cá - Papalagui


Nasce connosco a capacidade de explorar, nasce connosco o fascínio por tudo o que é novo e diferente, por tudo o que de alguma forma nos é estranho e provoca curiosidade, talvez por isso as pessoas no geral anseiem viajar ate novos territórios e culturas, interagir com novos povos, comer da sua comida e aprender curiosidades da sua língua nativa. 
Desde a época dos descobrimentos, quando toda a Europa lutava pela conquista de território novo, que foram muitas as descrições e relatos de episódios passados durante a corajosa e difícil tarefa de penetrar o destemido território, todo ele povoado por bárbaros seres, que apenas pela sua presença visual nos assustam e imputem respeito. Em todas estas descrições, muitas delas dos dias de hoje, encontra-se explicito o sentimento de espanto, respeito, medo ou desprezo por todo um exotismo e excentricidade que estas culturas transparecem ter. Desde cedo que o Homem ocidental sentiu necessidade de ajudar estes povos a evoluírem, a saírem das suas primitivas cabanas e a construírem grandes cidades e urbanizações, a utilizarem dinheiro e roupas, a uma vida monogamica ou a um trabalho fixo. 
Papalagui (de Erich Scheurmann ) é o nome atribuído ao homem branco por um chefe aborígene samoano, que após a sua visita á Europa  num período anterior à primeira guerra mundial, elabora discursos à sua tribo, descrevendo o que viu durante sua viagem.

O Papalagui mora, como o mexilhão do mar, dentro duma concha dura. Vive entre pedras, como a escolopendra entre fendas da lava. Tem pedras a toda a volta, de lado e por cima. A sua cabana assemelha-se a um baú de pedra posto ao alto; um baú cheio de cubículos e de buracos. (...)

É desta forma que Tuiavii descreve as sensações que teve ao viajar pela Europa, e é também assim que quase ridiculariza o Papalagui, pela sua forma excêntrica de viver, descrevendo-nos com o mesmo exotismo com que nós descreveríamos a sua tribo, ou qualquer outra que nos fosse estranha. Para ele a vida do Homem branco não faz sentido, e mostra isso ao longo dos seus discursos.
Através dos olhos de Tuiavii obtemos a nossa imagem, o nosso mundo puro e duro, descrito por um olhar livre de preconceitos ocidentais e livre de uma educação ou raiz cultural que influencie a sua interpretação daquilo que vê.
Enquanto conotarmos os outros povos como menos desenvolvidos, não seremos suficientemente hábeis para entender o quão exótica é a nossa cultura e o quão exóticos somos nos próprios. Nós que habitamos empilhados, em grandes metrópoles  nós que nos cobrimos de tecidos, com medo que alguém veja como somos nus, nós que nos adornamos e encenamos, nós que fazemos a vida em função de pequenas rodelas de metal, nós que delimitamos o nosso dia por algo a que chamamos horas, nós, Papalagui, o povo dotado de mais rituais estranhos e exóticos e da mais excêntrica forma de viver o seu dia a dia.


Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.